Introdução
A
precarização do trabalho em geral e a terceirização em particular, como
parte da “reestruturação produtiva” e da ofensiva neoliberal, foram
peças fundamentais para a elevação da taxa de exploração do trabalho nas
últimas duas décadas do século XX, contribuindo diretamente para a
recomposição da taxa de lucro do capital, proporcionando, dessa forma,
uma saída, ainda que limitada, para a sua crise nos anos 70.
Em
fins dos anos 80, após a derrota do ascenso operário e popular da
década anterior, mas sobretudo, na onda neoliberal e privatizante da
década de 90, a terceirização e a precarização do trabalho avançaram em
larga escala nos serviços, na indústria e até mesmo na Administração
Pública.
“Esta “nova ordem” foi imposta sobre a base da derrota do ascenso anterior, e em muitas casos diretamente a partir de ditaduras, o que chamamos de “democracias pós- contra revolucionárias”, mas acima de tudo, teve como base a fratura interna da classe trabalhadora como nunca antes. Junto à tradicional divisão imposta pelo capital entre a classe operária dos países imperialistas e das semicolônias e colônias, se somaram outras que deram lugar, junto à proliferação de desempregados permanentes, ao surgimento de trabalhadores “de segunda categoria” (contratos temporários, subcontratos por empresas “terceirizadas”, trabalhadores sem contrato legal, sem contrato coletivo, “sem registro em carteira”, ou diferentes combinações disso) que conformam quase metade da classe trabalhadora mundial, contrastando com o setor da classe operária “efetiva”, sindicalizada, com salários e condições de trabalho marcadamente superior à média” (Albamonte, Emilio e Maiello, Matias. Nos limites da restauração burguesa. Revista estratégia Internacional Brasil nº 5, 2011, São Paulo.)
No
Brasil, entre 1994 e 2002, durante os mandatos de FHC (PSDB), em meio
aos processos de privatização das principais estatais brasileiras, as
medidas neoliberais e a precarização do trabalho avançam em larga
escala. A partir de 2002, no Governo Lula (PT), ao contrário do que
levantavam seus ideólogos, a precarização laboral não apenas avança como
passa a ser um dos pilares fundamentais de sustentação de um
crescimento econômico amplamente dependente do sistema financeiro
internacional, das grandes construtoras e da exportação de commodities
para a China. Esse crescimento econômico é o que possibilitou ao governo
petista impulsionar programas sociais (Bolsa Família), extremamente
tímidos se comparados à medidas do “estado de bem estar social” dos EUA e
dos países europeus no pós-guerra, que, somado ao prestigio de Lula e a
cooptação dos principais sindicatos e entidades de massas, proporciona
uma grande estabilidade e garante que as grandes empresas nacionais
possam seguir auferindo seus fabulosos lucros num mar de relativa
“calmaria” social e política.
Mas
essa relativa passividade não pode esconder que hoje, segundo os dados
mais recentes, são mais 10 milhões de trabalhadores terceirizados em
todo o Brasil. Esse número não inclui os milhões de trabalhadores com
contratos temporários (que não entram nesses dados, pois são regulados
por lei específica) e principalmente os trabalhadores informais, que
formam cerca 30% dos 57 milhões de assalariados brasileiros.
Dessa
forma, no “Brasil Potência” de Lula e Dilma, enquanto parte dos
assalariados caminha para o abismo se endividando como nunca para viver
as maravilhas do “Brasil Potência”, outros milhões de trabalhadores
vivem sem os mais mínimos direitos básicos, com salários incompatíveis
com os gastos de uma família e em condições de trabalho sub-humanas que
se somam a histórica deficiência de moradia e saúde pública de
qualidade.
“(...) mesmo com todo o crescimento econômico (com diminuição do desemprego, aumento da renda média e redução da pobreza extrema) que caracterizou o lulismo, o desemprego estrutural e as favelas estão organicamente ligados à ampliação do trabalho precário como parte estrutural do capitalismo brasileiro. Essa relação se estabelece na medida em que a competição gerada pelo exército de mão-de-obra desempregada pressiona para baixo o custo de reprodução da força de trabalho; e as condições precárias e irregulares de moradia contribuem para viabilizar esse rebaixamento ou isentarem os capitalistas de terem que arcar com os custos de uma moradia digna nos salários pagos aos trabalhadores.” (MATOS, Daniel. Entre o gradualismo reformista e as contradições estruturais do país. Revista estratégia Internacional Brasil nº 5, 2011, São Paulo.)
Terceirização: a semiescravidão no século XXI
A terceirização, embora já
esteja disseminada em muitas áreas e atividades, se concentra
essencialmente nos serviços de limpeza, jardinagem, vigilância e
telemarketing, condicionando milhões trabalhadores, na sua grande
maioria de pele negra e do sexo feminino, a um regime de trabalho cujas
condições são, na maioria dos casos, análogas ao trabalho escravo.
Nos
canteiros de obras por todo o Brasil, em especial nas obras do PAC
(programa de aceleração do crescimento), dos estádios para a Copa e as
Olímpiadas, as grandes Construtoras são responsáveis por manter um
“exército” de centenas de milhares de operários que, não seria forçoso
dizer, vivem em condições semelhantes aos trabalhadores fabris do século
XIX. Nas obras da usina de Jirau, no Estado de Rondônia, os operários,
contratados por via da terceirização ou por contratos de subempreitada,
oriundos de regiões distantes e contratados sem nenhuma estabilidade,
denunciaram, em março de 2011, que cumpriam jornadas de trabalho de mais
de 14 horas diárias, não tinham atendimento médico, ficavam mais de 6
meses sem visitarem as famílias, recebiam alimentação estragada, além de
sofrerem frequentes assédios e agressões físicas por parte dos
seguranças contratados pelas empresas. Tudo isso num canteiro de obra em
pleno século XXI e mantido pela Camargo Corrêa, uma das cinco empresas
que mais contribuíram financeiramente para a campanha do PT nas últimas
eleições.
Quilômetros
de distância dos canteiros de obras da Usina de Jirau, na capital
paulista, trabalhadoras terceirizadas da Universidade de São Paulo
(USP), a maior e mais prestigiada instituição de ensino superior da
América Latina, traziam à tona sua verdadeira condição de trabalho.
Manuseavam produtos químicos de alto risco sem qualquer proteção, já que
nem a empresa prestadora nem a USP forneciam os devidos equipamentos de
segurança, eram forçadas a se alimentarem em banheiros (!) e conviviam
com constantes assédios e até agressões por parte das chefias. As
péssimas condições de trabalho, cujas consequências para a saúde dessas
trabalhadoras a Reitoria da USP parece não se importar, são tão
precárias que levaram a morte de um trabalhador terceirizado, José
Ferreira, que caiu de uma grande altura devido a precariedade de seu
equipamento de serviço.
Tais
casos não são exceções, essas mesmas situações foram encontradas em
muitos outros canteiros de obras e concentrações operárias do país, como
no complexo petroquímico de Suape, nas obras da usina de Santo Antônio
na região Norte do país e do PAC no estado de Goiás. O trabalho
semiescravo, entretanto, não está somente nos canteiros de obras da
região Norte e Nordeste do País. A precarização do trabalho também está
presente no Estado de São Paulo. São inúmeras as denuncias de
trabalhadores, principalmente terceirizados e temporários, que vivem em
condições de semiescravidão. Mais recentemente veio à tona a denuncia
que a Multinacional Zaira, do setor Têxtil, utilizava mão de obra
escrava em suas confecções.
Nos
prédios da Justiça do Trabalho acumulam-se pilhas de processos onde
trabalhadores terceirizados, muitas vezes por anos sem receber resposta
alguma, reivindicam seus direitos com empresas que sequer existem mais,
já que muitas dessas são verdadeiras empresas de fachada que desaparecem
na primeira oportunidade.
A Precarização do Trabalho coloca o Brasil no Topo do Ranking de países com mais acidentes e mortes no Trabalho
No Brasil, agora estampado nas
capas da imprensa internacional como a sexta economia do mundo, os
trabalhadores e povo pobre sofrem cotidianamente com as mortes nas
enchentes devido a negligência do governo, com a violência policial que
anualmente põem fim na vida de milhares de jovens pobres e negros nas
periferias e com a miséria em geral que ainda coloca milhões pessoas
abaixo da linha da pobreza. Mas, além disso, há um “genocídio
silencioso” que ocorre todos os anos em nosso país. Trata-se dos
acidentes de trabalho. Só em 2009 os acidentes de trabalho causaram a
morte de 2.496 trabalhadores e deixaram outros 13.047 incapacitados
permanentemente. Essas mortes e acidentes são frutos diretos da
precarização do trabalho. Os números da última pesquisa realizada sobre
terceirização são taxativos: De cada 10 acidentes de trabalho no país 8
são em empresas terceirizadas e a cada 5 mortes em decorrência do
trabalho 4 são de trabalhadores terceirizados.
A
terceirização e as precárias subcontratações na construção civil são
verdadeiras “fábricas” de acidentados e pessoas com doenças
ocupacionais. A maioria das empresas terceirizadas, para oferecer um
serviço a um baixo custo, se furta de utilizar os mínimos equipamentos
de segurança ou assegurar as mais elementares condições de higiene, além
de manterem uma pressão e um assédio descomunal contra os
trabalhadores, contribuindo diretamente para criar um ambiente de
trabalho completamente hostil e suscetível de mortes, acidentes,
alergias e intoxicação com produtos químicos.
O
regime semiescravo que essa “lógica moderna de gestão de recursos
humanos” mantém fez com que o Brasil, durante o ano de 2009, ocupasse o
terceiro lugar no ranking mundial de países com mais acidentes de
trabalho. De 2005 para cá os números só aumentaram. Em 2009 foram mais
de 723 mil acidentes registrados. E os números são infinitamente maiores
já que quase um terço da classe trabalhadora brasileira está na
informalidade e sequer são registradas ocorrências.
Justiça de Classe: O Papel da justiça do Trabalho na legitimação da precarização do
Trabalho.
Se por um lado a terceirização
encontrou na velha legislação trabalhista (CLT) corporativa da década de
40 um relativo obstáculo para sua disseminação, por outro, viu no
judiciário trabalhista, regulado por essa mesma legislação, um grande
aliado na tarefa de desobstruir todos os empecilhos legais que de alguma
maneira inviabilizavam que essa forma de precarização do trabalho
avançasse em diversas áreas. A Justiça do trabalho, como parte das
engrenagens da democracia burguesa, acompanhou detidamente o avanço do
trabalho precário, contribuindo diretamente na criação de uma cobertura
legal que proporcionou, inclusive, o avanço da terceirização na
Administração pública.
Em
1986, na falta de uma legislação própria, Tribunal Superior do
Trabalho, órgão de cúpula da justiça laboral, emitiu seu primeiro
enunciado (256) sobre o tema. Tal dispositivo legal abria as portas para
a terceirização. Ainda sim, foi considerado insuficiente pelos setores
patronais, pois apenas previa a possibilidade de terceirização de
algumas profissões estipuladas em lei específica e proibia claramente a
terceirização nos serviços públicos, inclusive levantando a hipótese de
formação de vinculo de emprego numa eventual contração de terceirizados
por parte dos órgãos públicos.
No
entanto, mais uma vez a justiça do trabalho decidiu a favor dos setores
patronais e, por via do enunciado 331 de 1993, expandiu a possibilidade
da terceirização em “atividades-meio” das empresas privadas e também no
serviço Público. A definição geral de “atividade-meio”, cuja definição
os próprios juristas e ministros do TST divergem, possibilitou um avanço
sem precedentes da terceirização. O TST, ao editar o novo enunciado,
também tomou o devido “cuidado” de proibir taxativamente qualquer
vínculo dos trabalhadores terceirizados com a Administração pública,
mesmo que haja contratação irregular ou em atividade fim.
“Enunciado 331 do TST:
II
- A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta,
não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública
direta, indireta ou fundacional”
Dessa
forma, a justiça do Trabalho garantiu uma barreira legal contra as
reivindicações para incorporação desses trabalhadores terceirizados ao
quadro dos funcionários efetivos. Pior, ainda previu que nos casos de
inadimplemento de créditos trabalhistas a Administração Pública tem
apenas responsabilidade subsidiaria, ou seja, o trabalhador terceirizado
só pode ir à juízo contra o poder público após percorrer longo caminho
processual contra a empresa prestadora do serviço. Assim, até mesmo a
possibilidade de pleitear seus direitos na justiça do trabalho segue
extremamente limitada e demasiadamente morosa.
Ainda
assim, as investidas dos setores patronais e da Justiça do Trabalho
contra as condições de trabalho não cessam. Pelo contrário, o cenário
internacional turbulento, a partir da crise econômica internacional que
hoje tem como epicentro o continente europeu, redobra a necessidade que a
burguesia brasileira tem de tomar medidas preparatórias para amenizar
suas perdas. A receita, como não poderia ser de outra maneira, é
justamente aprofundar as fórmulas que permitam, por via do aumenta da
exploração do trabalho, fazer com que sejam os trabalhadores que arquem
com a crise desse sistema irracional que a cada dia arrasta mais a
humanidade para uma barbárie. Nesse clima de preparação, e de alguma
forma também tentando responder aos recentes e cada vez mais constantes
conflitos envolvendo trabalhadores terceirizados, o TST realizou, em
outubro de 2011, uma audiência pública com o objetivo de chamar setores
da “sociedade civil” para debater o tema da terceirização.
Entretanto,
os setores da “sociedade civil” para o TST se resumem a dezenas de
representantes de entidades patronais que querem o aprofundamento do
trabalho terceirizado ou então algumas poucas entidades sindicais, como a
CUT, que mantêm um programa de “regularizar” e “controlar” a
semiescravidão. Entre os “ilustres” convidados estavam o Sr. Lívio
Giosa, representante do Centro Nacional de Modernização Empresarial,
além do presidente da Federação Brasileira de Bancos, Murilo Portugal
Filho.
Alguns
dias depois da Audiência Pública as turmas do TST passaram a
interpretar de maneira mais “flexível” o conceito de atividade meio.
Fazendo um balanço positivo da audiência, o Jornal Estadão, porta voz de
grande parte do empresariado paulista, fala sobre os julgamentos
realizados após a Audiência pública e comemora a liberação da
terceirização nas empresas de telefonia:
"Com
base nas audiências públicas, quando mais de 50 técnicos e acadêmicos
se manifestaram a respeito da subcontratação de mão de obra, o TST, que
até então considerava o call center uma atividade-fim das empresas de
telefonia, começou a rever seu entendimento. Invocando argumentos
apresentados nas audiências públicas, a 7.ª Turma, por exemplo,
autorizou a Oi a terceirizar seu call center. O relator Ives Gandra da
Silva Martins Filho alegou que o telemarketing é um instrumento para a
venda de serviços e lembrou que as leis que regulamentam os serviços
essenciais admitem subcontratação de mão de obra. (...) Elaborada com
base numa ampla e inédita consulta aos interessados, essa mudança de
entendimento mostra que o TST vem procurando adequar-se à evolução do
mercado de trabalho, por causa dos avanços da tecnologia e da
diversificação do setor de serviços." ( Editorial Estadão de 24 de
outubro de 2011)
A Revolta dos precarizados: um primeiro exercício.
O crescimento econômico e a
calmaria social do lulismo, que permanecem sob o governo de Dilma
Rouseff, não foram suficientes para impedir a explosão de lutas de
trabalhadores terceirizados e precarizados.
Na
construção civil, com os exemplos da luta dos operários de Jirau,
Suape, Santo Antônio, usina de Belo Monte, greve dos operários de
fortaleza, 2011 mostrou que uma parcela importante do proletariado desse
setor não aceitará passivamente as condições de trabalho degradantes a
qual as grandes construtoras querem empurrá-los.
Tais
lutas, ainda que com programas limitados, foram em geral levadas à cabo
com certo nível de espontaneidade, massividade e com métodos
radicalizados. Em jirau, durante todo o mês de Março, milhares de
operários paralisaram as obras, queimaram ônibus e alojamentos contra as
péssimas condições de trabalho encontradas no canteiro de Obra. O
governo Dilma só conseguiu “contornar” a situação a partir de um
trabalho combinado que contou com uma brutal repressão da força de
segurança nacional e com manobras e desvios levados à frente pela
burocracia sindical da CUT. Hoje as principais lideranças operárias do
conflito estão sendo indiciadas por formação de quadrilha e destruição
de patrimônio.
No
Estado do Pernambuco, mais de 30 mil operários paralisaram as obras da
refinaria Abreu e Lima e da Petroquímica Suape. A luta, que conquistou
algumas medidas econômicas mais favoráveis, só foi encerrada após o
Tribunal Regional do Trabalho do Estado declarar a greve ilegal. No
final de 2011, os trabalhadores das obras da Usina de Belo Monte,
combinando-se a inúmeros protestos de movimentos sociais e setores
populares devido a remoção de aldeias indígenas, entraram em greve por
melhores salários e condições de trabalho.
O
ano de 2012 também começa com importantes lutas de trabalhadores
terceirizados ou da construção civil. Os operários da obra da Usina
Angra 3 fizeram 6 dias de paralisação, inclusive com propostas e ações
por fora do sindicato (força Sindical). Em Janeiro mais de 8 mil
operários que trabalham na construção da indústria Eldorado, em Três
lagoas (MS), levaram uma importante luta por melhores condições de
Trabalho. Mais recentemente os trabalhadores da obra do Estádio “Arena
Pernambuco”, a 19 Km de Recife, paralisaram o trabalho no canteiro
também reivindicando melhores salários e condições de trabalho. Mesmo
sem a anuência do sindicato e com o Tribunal Regional do Trabalho de
Pernambuco julgando a greve ilegal os trabalhadores demostram, até o
momento que escrevemos essas linhas, uma importante disposição de seguir
paralisados.
Esse
extenso rol de lutas operárias num lapso temporal relativamente pequeno
deixam claro a disposição de luta desse setor de trabalhadores
precarizados que não querem ficar de fora das beneficies do crescimento
econômico dos últimos anos e muito menos suportar as condições de
semiescravidão que empresas como Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez,
Odebrecht, entre outras, se utilizam para manter suas altas taxas de
lucro. Essas movimentações, ainda iniciais, dispersas e com programa
limitado, são os primeiros exercícios de uma longa ginástica da luta de
classe que pode se aprofundar na medida em que a crise internacional
impacte o dependente crescimento econômico brasileiro.
A Burocracia Sindical e a precarização do Trabalho
Não é possível uma compreensão
completa do avanço da terceirização e do trabalho precário sem destacar o
papel da burocracia sindical cuja parcela mais degradada e atrelada à
patronal, como a Força Sindical, conseguiu, além dos milhões de reais
que já absorvem por via do imposto sindical, fazer rios de dinheiro
atuando em cooperação com as empresas prestadoras de serviços
terceirizados. Em muitos casos, os próprios burocratas sindicais tem
participação no capital dessas empresas ou então contribuem
arregimentando os trabalhadores para tais “empresas-máfias”.
Já
outra parcela da burocracia sindical, como a CUT, ainda que evita uma
colaboração em tal grau com as patronais, mantém uma relação
completamente conivente com a terceirização e totalmente passiva no que
diz respeito à mobilização dos terceirizados em unidade com os
trabalhadores efetivos. Não a toa que a resposta que a CUT dá contra a
terceirização é impulsionar um projeto de Lei, por via de seus
parlamentares, que tem por objetivo a regulamentação da terceirização.
O
deputado Vicentinho (PT), reconhecido burocrata sindical da CUT, foi o
responsável por apresentar o projeto de Lei que tramita já alguns anos
na Câmara Federal que tem por objetivo proibir a terceirização das
atividades fim das empresas e abrir completamente as portas para a
terceirização nas atividades meio. Em outras palavras, a CUT não vê
problema que milhões de trabalhadores dos setores de limpeza,
vigilância, telemarketing, jardinagem etc., sigam ganhando três ou
quatro vezes menos que seus colegas efetivos e sem inúmeros diretos
trabalhistas básicos.
Em
realidade, a “grande” novidade que a lei proposta pelos dirigentes da
CUT traz é a inversão da responsabilidade subsidiária da Administração
Pública para uma responsabilidade solidária. Dessa forma o trabalhador
terceirizado, que continuaria em empregos precários, com salários
menores, sem direitos, sem liberdade de organização sindical e política
teria a chance de propor uma ação contra a empresa e a Administração
Pública concomitantemente.
O
projeto de Lei da CUT é uma verdadeira regulamentação da
semiescravidão. Não dá qualquer saída para resolver as péssimas
condições de trabalho a qual milhões de trabalhadores terceirizados
estão submetidos. E de fato não poderia ser diferente já que essa
Central se constitui há muito tempo numa verdadeira correia de
transmissão dos interesses e propostas da burguesia para o movimento
operário. Com toda certeza, para avançar contra o trabalho precário os
trabalhadores que hoje saem a lutar nos canteiros de obra pelo extenso
território brasileiro necessitam saber quem são seus aliados.
Definitivamente, a CUT com seu projeto de regulamentar a semiescravidão e
seus profundos laços com o governo federal e muito menos a Força
sindical, completamente ligada a Patronal, não estão nesse campo.
O exemplo da luta das trabalhadoras terceirizadas da USP e o papel dos sindicatos classista.
Durante o mês de março de 2011,
mais de 400 trabalhadores terceirizados da empresa União, na sua quase
totalidade mulheres e negras, protagonizaram uma importante luta que,
sem sombra de dúvidas, marcou a história recente da Universidade de São
Paulo (USP).
Após
o atraso no pagamento dos salários e de outros benefícios centenas de
mulheres decidiram não somente sair à luta, mas também expor toda
situação precária a qual eram obrigadas a suportar. Atraso nos salários,
falta de equipamentos de segurança, assédios morais e sexuais por parte
das chefias eram parte da extensa lista de brutalidades que a empresa
União e a administração da USP destinavam a essas trabalhadoras.
Com
o apoio e a direção do Sindicato dos Trabalhadores da USP (SINTUSP), em
particular pela atuação da sua ala minoritária composta pelos
revolucionários da Liga Estratégia Revolucionária – Quarta Internacional
(LER-QI), as trabalhadoras da União lançaram mãos dos clássicos e
históricos métodos de luta do proletariado: Greve, piquetes na Reitoria e
marchas. Logo apareceram destacadas e combativas lideranças no
movimento que tomaram a direção do conflito junto ao SINTUSP, sindicato
cujo programa classista e não corporativo dá destaque na luta pela
unidade das fileiras operárias a partir de levantar o programa de
incorporação dos trabalhadores terceirizados ao quadro de efetivos sem a
necessidade de concurso público.
Exatamente
por levantar um programa combativo e de independência de classe o
SINTUSP e seus dirigente têm sido vítima de inúmeras investidas por
parte da Reitoria e do Governo do PSDB. Sem sombra de dúvida o exemplo
mais taxativo é a demissão do dirigente Claudionor Brandão. A Reitoria
da USP, numa verdadeira “monstruosidade” jurídica e num impressionante
desrespeito aos princípios e garantias consubstanciados na Constituição
Federal de 1988, demitiu Brandão, sem sequer realizar um inquérito
judicial de apuração de falta grave como manda a CLT, alegando que este
defendeu “interesses alheios” à universidade. Tais “interesses alheios”,
cuja explicação a Reitoria da USP omite, tratava-se de centenas de
trabalhadores terceirizados da USP com os quais Brandão reivindicava
seus direitos e salários atrasados.
De
todo modo, esses ataques não impediram que o SINTUSP seguisse firme na
sua luta contra a precarização do trabalho dentro da USP. A combinação
de um programa que levantava um questionamento mais profundo da
precarização do trabalho com os métodos de lutas da classe operária, e o
imprescindível apoio de um importante setor de estudantes, formando uma
verdadeira aliança operário-estudantil, foi fundamental para dar
visibilidade à luta das trabalhadoras da União e obrigar a Reitoria a
realizar o feito inédito de realizar o pagamento dos salários não pagos
pela empresa União.
Como
numa verdadeira “escola de guerra” essas trabalhadoras passaram por
experiências fundamentais. Viram e repudiaram o papel nefasto da
burocracia sindical. Perceberam a importância dos métodos de luta e de
auto-organização dos trabalhadores, assim como, da necessidade da busca
de aliados, como foram os estudantes da USP e alguns intelectuais de
esquerda. Passaram a compreender a importância de não cessar a luta com
os pagamentos e levantar o programa de incorporação sem concurso
público. E por fim tiveram a oportunidade conhecer sua própria história,
a história da classe operária mundial, ao participar da nutrida coluna
do ato do 1º de maio da LER-QI.
O
exemplo da luta das trabalhadoras terceirizadas da empresa União mostra
que apenas o programa de incorporação dos terceirizados aos quadros
efetivos, com mesmos salários e direitos, em contraposição direta ao
programa de regulamentação da terceirização, pode, combinado com os
históricos métodos de luta operário que dobram a vontade da burguesia,
acabar com a semiescravidão do século XXI e abrir portas para uma luta
resoluta dos trabalhadores contra as investidas que o capital arma e
prepara para jogar o custo da crise em suas costas.
Nessa
luta ganha destaque fundamental a batalha por sindicatos classistas e
independentes da patronal e do governo. Assim como também elementos de
auto-organização local que possam abrir suas portas para a atuação
conjunta de terceirizados e efetivos. Já em 1938, Trotsky explicava a
importância das comissões de fábrica como via de alcançar os setores
mais explorados da classe:
“Os
sindicatos, mesmo os mais poderosos, não abarcam mais de 20% a 25% da
classe operária, que, aliás, formam as camadas mais qualificadas e
melhor pagas. A maioria da classe operária não é arrastada à luta a não
ser episodicamente nos períodos de um excepcional auge do movimento
operário. Nesses momentos é necessário criar organizações ad hoc que
abarquem toda a massa em luta: os comitês de greve, os comitês de
fábrica e, enfim, os soviets”
As
recentes lutas explosivas dos setores precarizado mostra a necessidade
de que as organizações sindicais combativas, em primeiro lugar a Central
Sindical e Popular Conlutas, assim como os sindicatos que compõem,
passem a levantar abertamente o programa de incorporação dos
terceirizados (sem a necessidade de concursos no caso dos serviços
públicos), denunciando as manobras de regulamentação da terceirização da
Força Sindical e da CUT, impulsionando comissões de fábrica
independentes que reúna efetivos e terceirizados.
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