György Lukács
viveu, na sua trajetória como intelectual, os dilemas de buscar dar
continuidade às primeiras gerações de marxistas, que eram, ao mesmo
tempo, intelectuais e dirigentes revolucionários. Líder do Partido
Comunista (PC) da Hungria nos anos 1920, Lukács foi ministro da Cultura
de um governo de coalizão, até que, depois de vários reveses nos debates
internos do partido, resignou-se à sua condição de intelectual
marxista, em participação direta na atividade partidária.
Embora
não se constitua em algum dos casos típicos analisados por Perry
Anderson em seu clássico livro Considerações sobre o marxismo ocidental –
nem foi expulso ou viveu uma situação insuportável dentro do partido,
nem foi vítima da repressão fascista –, Lukács representa um dos grandes
dilemas dos intelectuais marxistas diante da chamada “stalinização dos
partidos comunistas”, que estreitou as margens de debate interno, a
ponto de inviabilizá-los.
Conforme
os partidos comunistas deixavam de ser espaços abertos ao debate e à
criação intelectual, bloqueando a articulação entre teoria e prática
marxistas, produzia-se uma das grandes cisões de que o movimento
comunista, socialista e de esquerda em geral passou a sofrer desde
então: teorias sem práticas políticas e práticas sem teorias políticas. O
marxismo perdia fertilidade concreta e a prática deixava de ser
iluminada pela teoria.
Como
teoria que pretende não apenas interpretar a realidade, mas
transformá-la, o marxismo busca articular deciframento da realidade e
sua transformação revolucionária. A interpretação sem seu desdobramento
na prática política desvirtua a essência do marxismo, ao mesmo tempo em
que a prática política sem sua interpretação radical fere outro dos seus
postulados, formulado por Lenin: “Sem teoria revolucionária, não há
prática revolucionária”.
As
gerações de Marx, Engels, Lenin, Trotski, Rosa Luxemburgo e Gramsci
foram sucedidas por grandes teóricos, como Lukács, Jean-Paul Sartre,
Theodor Adorno, Walter Benjamin, Ernst Bloch – e depois deles uma nova
leva de intelectuais revolucionários, da qual István Mészáros é exemplo
–, entre tantos outros, brilhantes pensadores que nunca capitularam,
mantendo-se firmes nas concepções anticapitalistas, apesar de tudo o que
vitimava o marxismo e a esquerda em geral – da social-democracia ao
stalinismo.
No entanto, o campo
da esquerda, das forças anticapitalistas e socialistas passou a sofrer
dessa cisão entre teoria e prática. Perderam fertilidade política,
renunciaram à dimensão inerente ao marxismo de teoria articulada com a
transformação revolucionária do mundo.
“Sem
teoria revolucionária, não há prática revolucionária”, afirmava Lenin. A
prática política dos partidos de esquerda tendeu a deixar-se guiar pela
agenda do sistema dominante, enquanto que os intelectuais tenderam ao
ultraesquerdismo: entre uma teoria aparentemente perfeita e uma prática
sempre heterodoxa, os intelectuais tendem a ficar com a teoria e a
desprezar a prática política. Como resultado, ambos se esterilizam.
O
mundo acadêmico – onde grande parte da intelectualidade desenvolve suas
práticas profissionais – não foi poupado pelas grandes transformações
operadas na passagem do período histórico anterior para o atual. Uma
parte dos intelectuais, diante da transformação do mundo multipolar em
unipolar, assumiu diferentes formas de adaptação à hegemonia capitalista
e às variantes da doutrina liberal. Uma parte significativa segue
processos de produção de conhecimento pertinente, porém prisioneiro da
divisão técnica do trabalho acadêmico e da especialização
correspondente.
Outro
contingente, por sua vez, deixa-se aprisionar pelos mecanismos
doutrinários, que desembocam em posições ultraesquerdistas,
desvinculadas da realidade concreta. Os novos processos políticos
latino-americanos representam estímulos para decifrar seu significado e
para contribuir para seu aprofundamento. Questões centrais têm surgido
com novas roupagens ou mesmo novas questões, desafiando a
intelectualidade latino-americana. Esses processos avançaram com graus
diversos de teorização, porém seguramente as dificuldades que enfrentam
dependem também de profundo debate e elaboração teórica e política, para
que possam efetivamente consolidar os avanços realizados e
encaminhar-se para a construção de sociedades que permitam a superação
da exploração, da opressão, da discriminação e da alienação.
Trecho
de texto publicado em István Mészáros e os desafios do tempo histórico,
organização de Ivana Jinkings e Rodrigo Nobile (Boitempo, 2011).
Fonte: Blog da Boitempo
Emir Sader
Ver Obras de Lukács em:
(verificar também os sites www.4share.com, http://library.nu/ ) neles sempre há novos textos de Lukács, Marx, Mészáros, etc. que se pode baixar.
Alguns Materiais disponíveis:
A Destruição da Razão - (alemão)
Asalto a la Razón
Soul and Form - (inglês)
Ontologia
Traduções para o português, texto original em alemão do capítulo "O trabalho"
Traduções para o português, texto original em alemão do capítulo "O trabalho"
Para Uma Ontologia - Parte I
Para Uma Ontologia - Parte II
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