sábado, 8 de junho de 2013

Orientação metodológica para construção e leitura de mapas temáticos

O artigo sistematiza os conceitos fundamentais do processo cartográfico que devem ser observados na construção de mapas úteis para a análise e compreensão do espaço geográfico. Estabelece uma correlação entre os mapas gerados com auxilio de softwares livres, a semiologia gráfica e o preparo do “construtor” de mapas. Por meio de uma exposição didática, apresenta uma classificação para os mapas quanto ao modo de expressão, escala, conteúdo, modo de implantação, nível de organização, variável visual e métodos de mapeamento, no sentido de contribuir para a formação de “construtores” e “leitores” de mapas. Por fim, analisa a linguagem cartográfica apresentada em mapas em várias escalas.

Mapa

No Brasil utiliza-se o termo mapa, de forma genérica, para identificar vários tipos de representação cartográfica. Mesmo que, em alguns casos, a representação não passe de uma lista de palavras e números, ou de um gráfico que mostre como ocorre determinado fenômeno, essa representação recebe o nome de mapa.
2Embora o termo esteja popularizado, a grande maioria dos brasileiros possui um conhecimento muito restrito de cartografia devido ao nível de importância que é dado à alfabetização cartográfica no ensino formal e à difusão de mapas para uso cotidiano. Porém, os mapas estão em toda parte, jornais, revistas, canais abertos de televisão – quem não olha o mapa do tempo no jornal diário?  - mapa rodoviário, do metrô, da cidade, e tantos outros que poderiam servir para alguma coisa, mas que quando existem, desorientam mais do que orientam. Talvez para o usuário (consumidor) não interesse como eles foram feitos, mas, se servem à necessidade imediata, se cumprem seu objetivo.
3Se considerarmos que os mapas servem de orientação e de base para o planejamento e conhecimento do território, a sociedade acaba sendo consumidora dessas representações cartográficas que são um meio de comunicação. Porém, na maioria das vezes, esses mapas não têm cumprido o seu papel. Nas palavras de Loch (2006, p.27),“a função de um mapa quando disponível ao público é a de comunicar o conhecimento de poucos para muitos, por conseguinte ele deve ser elaborado de forma a realmente comunicar”. Provavelmente, parte da responsabilidade pela atual proliferação de mapas pouco eficazes se deve também, ao acesso irrestrito às ferramentas tecnológicas desenvolvidas para análise de dados espaciais aliadas ao desconhecimento dos procedimentos inerentes à representação cartográfica.
4Do ponto de vista científico, a busca por métodos que dêem conta da representação de processos complexos da contemporaneidade também provocou o aumento de pesquisas em áreas emergentes como o geoprocessamento, a informática, o meio ambiente e a saúde pública, para os quais os sistemas de informação geográfica fornecem ferramentas que ajudam na produção de mapas. Isso certamente contribui, cada vez mais, para que os mapas sejam concebidos como documentos que revelam o visível e o invisível na imagem, como, por exemplo, as concepções ideológicas de uma sociedade. No entanto, independente do objetivo, o mapa como um meio de comunicação exige conhecimentos específicos de Cartografia, tanto de seu criador como do usuário, leitor e consumidor.
5O texto que segue, de cunho francamente didático, pretende portanto trazer un pouco de clareza sobre os diferentes tipos de mapas tématicos,  os métodos de mapeamento e modos de expressāo, sem esquecer a importante questão da escala.

Mapas temáticos

6Na cartografia, os mapas têm características específicas que os classificam, e representam elementos selecionados de um determinado espaço geográfico, de forma reduzida, utilizando simbologia e projeção cartográfica. Para os cartógrafos, escreve Loch (2006, p.33), os mapas são veículos de transmissão do conhecimento que pode ser o mais amplo e variado possível ou o mais restrito e objetivo possível e afirma que “cada mapa tem seu autor, uma questão e um tema, mesmo os mapas de referência geral, os topográficos ou os cadastrais”.
7Sobre a questão dos mapas temáticos, Joly (2005, p.75) afirma que todo o mapa, qualquer que seja ele, ilustra um tema e até o mapa topográfico não escapa à regra. Dessa forma, define como mapas temáticos “todos os mapas que representam qualquer tema, além da representação do terreno”. Os procedimentos de levantamento, redação e comunicação de informações por meio de mapas, diferem de acordo com a formação e especialização dos profissionais em cada campo, a exemplo dos geólogos, geomorfólogos, geógrafos, entre outros, que se expressam na forma gráfica.
8A elaboração de mapas temáticos abrange as seguintes etapas: coleta de dados, análise, interpretação e representação das informações sobre um mapa base que geralmente, é extraído da carta topográfica. Os mapas temáticos são elaborados com a utilização de técnicas que objetivam a melhor visualização e comunicação, distinguindo-se essencialmente dos topográficos, por representarem fenômenos de qualquer natureza, geograficamente distribuídos sobre a superfície terrestre. Os fenômenos podem ser tanto de natureza física como, por exemplo, a média anual de temperatura ou precipitação sobre uma área, de natureza abstrata, humana ou de outra característica qualquer, tal como a taxa de desenvolvimento, indicadores sociais, perfil de uma população segundo variáveis tais como sexo, cor e idade, dentre outros.
9Cada mapa possui um objetivo específico, de acordo com os propósitos de sua elaboração, por isso, existem diferentes tipos de mapas. O mapa temático deve cumprir sua função, ou seja, dizer o quê, onde e, como ocorredeterminado fenômeno geográfico, utilizando símbolos gráficos (signos) especialmente planejados para facilitar a compreensão de diferenças, semelhanças e possibilitar a visualização de correlações pelo usuário. O fato dos mapas temáticos não possuírem uma herança histórica de convenções fixas, a exemplo dos topográficos, se deve às variações temáticas e aos aspectos da realidade que representam, sendo necessárias adaptações diferenciadas a cada situação.
10No entanto, para representar os diversos temas é preciso recorrer a uma simbologia específica que, aplicada aos modos de implantação - pontual, linear ou zonal, aumentam a eficácia no fornecimento da informação. As regras dessa simbologia pertencem ao domínio da semiologia gráfica.
11A semiologia gráfica foi desenvolvida por Bertin (1967) e está ao mesmo tempo ligada às diversas teorias das formas e de sua representação, e às teorias da informação. Aplicada à cartografia, ela permite avaliar as vantagens e os limites da percepção empregada na simbologia cartográfica e, portanto, formular as regras de uma utilização racional da linguagem cartográfica, reconhecida atualmente, como a gramática da linguagem gráfica, na qual a unidade lingüística é o signo.
12O signo (símbolo) é constituído pela relação entre o significante (ouvir falar de algo como por exemplo, papel), o objeto referente (esse papel) e o significado (idéia de papel formada na mente do interlocutor ao ouvir falarpapel, um papel qualquer). No entanto, o signo é constituído por significante (mensagem acústica: papel) e significado (conceito, idéia de papel). Por exemplo, num mapa do uso das terras, o signo constituído pelo significante "cor laranja" tem o significado de cultura permanente. Dessa forma, os signos são construídos basicamente, com a variação visual de forma, tamanho, orientação, cor, valor e granulação para representar fenômenos qualitativos, ordenados ou quantitativos nos modos de implantação pontual, linear ou zonal (figura 1).
Figura 1 – Quadro de Variáveis Visuais. Fonte: Joly, F. (2005, p.73).
13A variável visual tamanho corresponde à variação do tamanho do ponto, de acordo com a informação quantitativa; a variável visual valor pressupõe a variação da tonalidade ou de uma seqüência monocromática; a granulaçãocorresponde a variação da repartição do preto no branco onde deve-se manter a mesma proporção de preto e de branco; a variável visual corsignifica a variação das cores do arco-íris, sem variação de tonalidade, tendo as cores a mesma intensidade. Por exemplo: usar azul, vermelho e verde é usar a variável visual “cor”. O uso do azul-claro, azul médio e azul escuro corresponde à variável “valor”. A variável visual orientaçãocorresponde às variações de posição entre o vertical, o oblíquo e o horizontal e, por fim, a forma, agrupa todas as variações geométricas ou não.
14A observação das regras apresentadas no quadro de variáveis visuais (Bertin, 1967) permite uma comunicação muito mais eficaz. Com exceção da variável visual cor (matiz), a utilização correta das demais permite a representação em preto ou tons de cinza; técnicas muito importantes quando o mapa elaborado precisa ser impresso com baixo custo, porém, com ótimos resultados.
15A legenda deverá ser organizada de acordo com a relação existente entre os dados utilizando as variáveis visuais que representem exatamente as mesmas relações, ou seja, essa relação poderá ser qualitativa, ordenada ou quantitativa. Na construção da legenda, após identificar a variável visual mais adequada ao tipo de informação que se quer representar, e seu respectivo modo de implantação, acontece a transcrição da linguagem escrita para a gráfica, escreve Archela (1999, p. 10). Dessa forma, as relações entre os dados e sua respectiva representação, são pontos de partida na caracterização da linguagem cartográfica.  
16Para que o processo de comunicação entre o construtor do mapa e o usuário – leitor do mapa se estabeleça, os seguintes princípios jamais poderão ser ignorados:
  • Um fenômeno se traduz por um só sinal. Exemplo: arroz, feijão e milho. Não apresenta quantidade e nem ordem. A informação nesse caso é qualitativa e a variável visual mais adequada para sua representação é a forma ou a cor (matiz).
  • Uma ordem se traduz somente por uma ordem. Exemplo: densidades, hierarquias e seqüências ordenadas, ou seja, quando a informação quantitativa é ordenada em classes e a variável visual mais adequada é o valor (monocromia). Nesses casos, não se deve utilizar a variável visual tamanho porque não é possível diferenciar quanto vale cada ponto dentro da classe estabelecida.
  • Variações quantitativas se traduzem somente pela variável visual tamanho.
17Além das variáveis visuais, o quadro apresentado na figura 1, também apresenta os modos de implantação. Esses são diferenciados de acordo com a extensão do fenômeno na realidade. Dessa forma, distinguem-se três modos de implantação: implantação pontual, quando a superfície ocupada é insignificante, mas localizável com precisão; implantação linear, quando sua largura é desprezível em relação ao seu comprimento, o qual, apesar de tudo, pode ser traçado com exatidão; implantação zonal, quando cobre no terreno uma superfície suficiente para ser representada sobre o mapa por uma superfície proporcional homóloga.
18As variáveis visuais podem ser percebidas de modo diferente, conforme um conjunto de propriedades que podem ser: seletivas, associativas, dissociativas, ordenadas e quantitativas. São chamadas variáveis visuais seletivas, quando permitem separar visualmente as imagens e possibilitam a formação de grupos de imagens. A cor, a orientação, o valor, a granulação e o tamanho possuem essa propriedade. São associativas quando permitem agrupar espontaneamente, diversas imagens num mesmo conjunto; forma, orientação, cor e granulação possuem a propriedade de serem vistos como imagens semelhantes. Ao contrário, quando as imagens se separam espontaneamente, a variável é dissociativa; este é o caso do valor e do tamanho. São chamadas variáveis ordenadas quando permitem uma classificação visual segundo uma variação progressiva. São ordenados o tamanho, valor e a granulação. Finalmente, são quantitativas quando se relacionam facilmente com um valor numérico. A única variável visual quantitativa é o tamanho. Isto porque somente as figuras geométricas possuem uma área e um volume que pode ser visualizado com facilidade, permitindo relacionar imediatamente com uma unidade de medida e, portanto, com uma quantidade que é visualmente proporcional. Loch (2006, p.128) escreve “que conhecer e distinguir as características de cada variável visual é importante porque ajuda o cartógrafo a construir mapas temáticos que atendem aos objetivos de comunicação e a fazer mapas capazes de transmitir a sensação condizente com as características dos dados”, consequentemente, ajuda a fazer mapas úteis.

Métodos de mapeamento

19O nível de organização dos dados, qualitativos, ordenados ou quantitativos, de um mapa está diretamente relacionado ao método de mapeamento e a utilização de variáveis visuais adequadas à sua representação. A combinação dessas variáveis, segundo os métodos padronizados, dará origem aos diferentes tipos de mapas temáticos, entre os quais os mapas de símbolos pontuais, mapas de isolinhas e mapas de fluxos; mapas zonais, ou coropléticos, mapas de símbolos proporcionais ou círculos proporcionais, mapas de pontos ou de nuvem de pontos.

Fenômenos Qualitativos

20Os métodos de mapeamento para os fenômenos qualitativos utilizam as variáveis visuais seletivas forma, orientação e cor, nos três modos de implantação: pontual, linear e zonal. A partir desses fenômenos derivam-se os três tipos de mapas a seguir (figuras 2, 3 e 4).
21A construção de mapa de símbolos pontuais nominais leva em conta os dados absolutos que são localizados como pontos e utiliza como variável visual a forma, a orientação ou a cor. Também é possível utilizar símbolo geométrico associado ou não as cores (figura 2). A disposição dos pontos nesse mapa cria uma regionalização do espaço formada especificamente pela presença/ausência da informação.
Figura 2 – Mapas de símbolos pontuais com informação seletiva no modo de implantação pontual.
22Os mapas de símbolos lineares nominais são indicados para representar feições que se desenvolvem linearmente no espaço como a rede viária, hidrografia e, por isso, podem ser reduzidos a forma de uma linha. As variáveis visuais utilizadas são a forma e a cor. Esses mapas também servem para mostrar deslocamentos no espaço indicando direção ou rota (rotas de transporte aéreo, correntes oceânicas, fluxo de migrações, direções dos ventos e correntes de ar) sem envolver quantidades. Nesses mapas qualitativos a espessura da linha permanece a mesma, variando somente sua direção (figura 3).
Figura 3 – Mapa de conexão com informação seletiva no modo de implantação linear
23Os mapas corocromáticos apresentam dados geográficos e utilizam diferenças de cor na implantação zonal. Este método deve ser empregado sempre que for preciso mostrar diferenças nominais em dados qualitativos, sem que haja ordem ou hierarquia. Também é possível o uso das variáveis visuais granulação e orientação, neste caso, as diferenças são representadas por padrões preto e branco. Quando do uso de cores, estas devem separar grupos de informações e os padrões diferentes e serem aplicados, para fazer a subdivisão dentro dos grupos. Para os usuários, a visualização de fenômenos qualitativos em mapas corocromáticos, apenas aponta para a existência ou ausência do fenômeno e não a ordem ou a proporção do fenômeno representado (figura 4).
Figura 4 – Mapa corocromático com informação seletiva no modo de implantação zonal

Fenômenos Ordenados

24Os fenômenos ordenados são representados em classes visualmente ordenadas e utilizam a variável valor na implantação zonal. Os mapas mais significativos para representar fenômenos ordenados são os mapas coropléticos.
25Os mapas coropléticos são elaborados com dados quantitativos e apresentam sua legenda ordenada em classes conforme as regras próprias de utilização da variável visual valor por meio de tonalidades de cores, ou ainda, por uma seqüência ordenada de cores que aumentam de intensidade conforme a seqüência de valores apresentados nas classes estabelecidas. Os mapas no modo de implantação zonal (figura 5), são os mais adequados para representar distribuições espaciais de dados que se refiram as áreas. São indicados para expor a distribuição das densidades (habitantes por quilômetro quadrado), rendimentos (toneladas por hectare), ou índices expressos em percentagens os quais refletem a variação da densidade de um fenômeno (médicos por habitante, taxa de natalidade, consumo de energia) ou ainda, outros valores que sejam relacionados a mais de um elemento.
Figura 5 – Mapa coroplético com informação ordenada no modo de implantação zonal

Fenômenos Quantitativos

26Os fenômenos quantitativos são representados pela variável visual tamanho e podem ser implantados em localizações pontuais do mapa ou na implantação zonal, por meio de pontos agregados, como também, na implantação linear com variação da espessura da linha.
27Os mapas de símbolos proporcionais representam melhor os fenômenos quantitativos e constituem-se num dos métodos mais empregados na construção de mapas com implantação pontual. Esses mapas são utilizados para representar dados absolutos tais como população em número de habitantes, produção, renda, em pontos selecionados do mapa. Geralmente utiliza-se o círculo proporcional aos valores que cada unidade apresenta em relação a uma determinada variável (figura 6), porém, podem-se utilizar quadrados ou triângulos. A variação do tamanho do signo depende diretamente da proporção das quantidades que se pretende representar. Geralmente o número de classes com utilização do tamanho, deve atingir no máximo cinco classes.
Figura 6 – Mapa de círculos proporcionais com informação quantitativa no modo de implantação pontual
28Recomenda-se evitar duas formas de símbolos proporcionais num mesmo mapa (circulo e triângulo), pois dificultam a comunicação cartográfica. Especialmente, quando é necessário representar duas informações quantitativas com implantação pontual, pode-se recorrer ao mapa de círculos concêntricos (figura 7) ou o mapa de semicírculos opostos (figura 8) que permite a comparação de uma mesma variável obtida em períodos diferentes.
29O mapa de círculos concêntricos consiste na representação de dois valores ao mesmo tempo por meio de dois círculos sobrepostos com cores diferentes. Este tipo de representação é recomendado para a apresentação de uma mesma informação em períodos distintos, ou para duas informações diferentes com dados não muito discrepantes.
Figura 7 – Mapa de círculos concêntricos com informação quantitativa no modo de implantação pontual
Figura 7 – Mapa de círculos concêntricos com informação quantitativa no modo de implantação pontual
Figura 8 – Mapa de semicírculos opostos com informação quantitativa no modo de implantação pontual
30Para representar quantidades na implantação zonal utilizam-se os mapas de pontos. Esse mapa possui a vantagem de possibilitar uma leitura muito fácil por meio da contagem dos pontos, dando a sensação de conhecimento da realidade. No entanto a elaboração desse mapa pressupõe muita abstração uma vez que a distribuição dos pontos não ocorre segundo a distribuição do fenômeno.
31Os mapas de pontos ou de nuvem de pontos (figura 9) expõem dados absolutos (número de tratores de um município, numero de habitantes, totais de produção, etc.) e o número de pontos deve refletir exatamente o número de ocorrências. Sua construção depende de duas decisões: qual valor será atribuído a cada ponto e como esses pontos serão distribuídos dentro da área a ser mapeada.
Figura 9 – Mapa de nuvem de pontos com informação quantitativa no modo de implantação pontual no qual se visualiza uma mancha mais clara ou mais escura consoante a ocorrência do fenômeno representado.
32Os mapas isopléticos ou de isolinhas são construídos com a união de pontos de mesmo valor e são aplicáveis a fenômenos geográficos que apresentam continuidade no espaço geográfico. Podem ser construídos a partir de dados absolutos de altitude do relevo (medida em determinados pontos da superfície da Terra); temperatura, precipitação, umidade, pressão atmosférica (medidas nas estações meteorológicas); distância-tempo, ou distância-custo (medidas em certos pontos ao longo de vias de comunicação) e outros, como volume de água (medida em pontos de captação); também podem ser construídos a partir de dados relativos como densidades, percentagens ou índices.
33Os mapas de fluxo são representações lineares que tentam simular movimentos entre dois pontos ou duas áreas (figura 10). Esses movimentos podem ser medidos em certos pontos ao longo das vias de comunicação ou entre duas áreas, na origem e no destino sem necessariamente especificar a via de comunicação. Esse tipo de mapa mostra claramente em que direção os valores ou intensidades de um fenômeno crescem ou decrescem.
Figura 10 – Mapa de fluxo com informação quantitativa no modo de implantação linear.
34Vários tipos de mapas temáticos podem ser construídos de acordo com os métodos apresentados, porém, outros fatores, como o modo de expressão, escala e conteúdo dos mapas, são igualmente importantes e devem ser observados no processo de elaboração e leitura de mapas.

Modo de expressão

35Modo de expressão diz respeito a cada tipo específico de representação cartográfica e está relacionado ao objetivo da construção e a escala. Os mais comuns são o mapa e a carta.
36O mapa resulta de um levantamento preciso e exato, da superfície terrestre, e é apresentado em escala pequena (escalas inferiores a 1:1.000.000). Os limites do terreno representado coincidem com os limites político-administrativo, sendo que o título e as informações complementares são colocados no interior do quadro de representações que circunscreve a área mapeada. São exemplos característicos de mapas, o mapa mundi,mapa dos continentes, mapas nacionais, estaduais, regionais, municipais, mapas políticos e administrativos, organizados em atlas de referência, atlas temáticos e escolares, ou em livros didáticos.
37A carta é uma representação de parte da superfície terrestre em escala média ou grande, dos aspectos artificiais e naturais de uma área, subdividida em folhas delimitadas por linhas convencionais - paralelos e meridianos - com a finalidade de possibilitar a avaliação de detalhes, com grau de precisão compatível com a escala. Geralmente, essas representações possuem como limites as coordenadas geográficas, e raramente terminam em limites político-administrativo. As observações e informações tais como título, escala e fonte, aparecem fora das linhas que fecham o quadro da representação, ou seja, a linha que circunscreve a área objeto de representação espacial.
38Entre os tipos de mapas menos utilizados aparecem o cartograma e a anamorfose cartográfica. Cartograma ou mapa diagrama é uma das denominações que recebe um mapa que representa dados quantitativos em forma de gráfico sobre mapas de áreas extensas como estados, países, regiões. Esse termo se cristalizou no Brasil nas décadas de 1960-1980, como usual para mapas nessas escalas. Conforme Sanchez (1981), são representações que se lidam menos com os limites exatos e precisos como as coordenadas geográficas, para se preocupar mais, com as informações que serão objeto de distribuição espacial no interior do mapa, a fim de que o usuário possa visualizar seu comportamento espacial.
39Anamorfose é uma figura aparentemente disforme que, por reflexão num determinado sistema óptico produz uma imagem regular do objeto que representa, a anamorfose cartográfica ou geográfica é uma figura que expõe o contorno dos espaços representados de forma distorcida para realçar o tema. A área das unidades espaciais é alterada de forma proporcional ao respectivo valor, mantendo-se as relações topológicas entre unidades contíguas. Por exemplo, numa carta que represente a distribuição geográfica da densidade populacional, as áreas dos municípios podem ser ampliadas ou reduzidas de acordo com o afastamento daquele parâmetro em relação à média (figura 11). Em outros casos, a distorção do espaço é realizada de acordo com o valor de certos tipos de relação espacial entre lugares, tais como a distância medida ao longo das estradas ou o tempo de deslocamento gasto para percorrer essa distância.  
Figura 11 – Exemplo de anamorfose

Escala

40A escala do mapa é um fator de aproximação do terreno e possui significado científico e técnico. No plano da pesquisa e do levantamento de campo, a escala determina o nível de detalhe em função do espaço a ser mapeado; no estágio da redação, a escala é a condição da precisão, da legibilidade, da boa apresentação e da eficiência do mapa.
41O número e o acúmulo dos símbolos empregados dependem do espaço disponível (tamanho da folha que será impresso), ou seja, quanto maior a redução da imagem terrestre, menor será a escala, mais severa a seleção das informações e mais abstrata a simbologia.
42Um mapa na escala 1:1.000.000 significa que 1cm lido no mapa equivale a 1.000.000 de cm (ou 10 km) da distância real. A escala deve estar localizada em uma posição de destaque no mapa. Pode-se representá-la na forma numérica (Escala 1:1.000.000) ou gráfica. A escala gráfica é um segmento de reta dividido de modo a permitir a medida de distâncias na carta. Este tipo de escala permite visualizar, as dimensões dos objetos representados no mapa. O uso da escala gráfica tem vantagens sobre o de outros tipos, pois será reduzido ou ampliado juntamente com o mapa, através de métodos fotográficos ou copiadoras, podendo-se sempre saber a escala do documento com o qual se está trabalhando.
43Normalmente as escalas são classificadas em função do tema representado. O quadro (figura 12) mostra uma classificação geral das escalas em função do tamanho escala geográfica e aplicações.
Tamanho da Escala
Escala
Escala Geográfica e Aplicações
Escala Grande
maiores que 1:25.000
Escala de Detalhe  (visão local) - Plantas Cadastrais, Levantamentos de Detalhes ou Planos topográficos e Cartas Temáticas.
Escala Média
de 1: 25:0000
até 1:250.000
Escala de Semi-Detalhe (visão local e regional) - Cartas Topográficas;  Mapas e Cartas Temáticas
Escala Pequena
menores que
1: 250.000
Escala de Reconhecimento ou de Síntese  (visão regional, nacional e global) - Cartas Topográficas e Mapas Temáticos.
Figura 12 – Classificação geral das escalas em função do tamanho escala geográfica e aplicações
44A escala de um mapa não é apenas uma simples relação de redução. É também, um meio de representar a realidade sobre uma dada superfície de papel (ou monitor), uma maior ou menor porção do espaço. A escala é, portanto, um meio de enfocar objetos da realidade conforme as diversas ordens de grandeza, desde as que se medem em milhares de quilômetros até as que não ultrapassam alguns metros. Daí decorre a importância fundamental da escala para a Cartografia, uma vez que todos os tipos de representação cartográfica e todos os procedimentos cartográficos dependem estritamente dela. Entre esses procedimentos encontra-se a generalização que é o processo de adaptação dos elementos de um mapa de uma dada escala para uma escala inferior. Tecnicamente, a generalização compreende a seleção dos detalhes da realidade que serão mantidos no mapa em função do tema ou de seu valor como referência geográfica; e uma esquematização do desenho que, consiste em atenuar características desprezíveis para acentuar os caracteres mais importantes, que desapareceriam com a redução, procurando preservar as relações espaciais observadas na realidade e resguardando sua legibilidade.
45Quanto às aplicações há uma diferenciação entre as cartas temáticas e topográficas. Cartas topográficas em escalas maiores de 1:25.000, são chamadas, convencionalmente, por plantas cadastrais e são utilizadas para representar cidades com alta densidade de edificações em escala grande e muito detalhada. As cartas topográficas em escalas médias possuem as seguintes características: 1:25.000 representam áreas específicas e com forte densidade demográfica; as de 1:50.000 retratam zonas densamente povoadas; 1:100.000 representam áreas priorizadas para investimentos governamentais; e as cartas de 1:250.000 fornecem as bases para o planejamento regional e projetos envolvendo o meio ambiente. Com relação às especificidades das cartas topográficas em escalas menores, as de 1:500.000 são de uso aeronáutico e foram confeccionadas nos EUA durante a Segunda Guerra Mundial. Finalmente, as de 1:1.000.000, são formadas por um conjunto de 46 cartas que recobrem completamente o território brasileiro e fazem parte da Carta Internacional do Mundo ao Milionésimo – CIM. Elas representam toda a superfície terrestre e fornece subsídios para estudos e análises de aspectos gerais e estratégicos.
46Geralmente, as cartas topográficas servem de base cartográfica para a elaboração de mapas temáticos, por isso, é importante conhecer a disponibilidade desse mapeamento específico no Brasil. Os mapeamentos existentes, em escalas de visão regional e local, recobrem porções do território equivalentes aos seguintes percentuais de cobertura sistemática: 81% (1:250.000), 75% (1:100.000), 14% (1:50.000) e 1% (1:25.000). Os altos índices de vazios cartográficos, nas diversas escalas, e a inexistência de atualizações das folhas topográficas existentes, correspondem a lacunas na representação dos aspectos físicos e antrópicos da realidade brasileira. Segundo a Comissão Nacional de Cartografia grande parte do mapeamento disponível possui mais de trinta anos, ressaltando-se também os baixíssimos níveis de cobertura do território nas escalas 1:25.000 e 1:50.000 e a falta de cobertura em escala topográfica de grandes extensões da Amazônia, em especial na faixa de fronteira internacional (CONCAR, 2005).

Classificação quanto ao conteúdo

47Quanto ao conteúdo os mapas podem ser classificados em analítico ou de síntese. O mapa analítico mostra a distribuição de um ou mais elementos de um fenômeno, utilizando dados primários, com as  modificações necessárias para a sua visualização. São exemplos de mapas analíticos os mapas de distribuição da população, cidades, supermercados, redes hidrográficas e rodovias entre outros tantos temas (figura 13).
Figura 13 - Mapa analítico - círculos proporcionais sobrepostos ao coroplético, representando aspectos de um único fenômeno.
48O mapa de síntese é mais complexo e exige profundo conhecimento técnico dos assuntos a serem mapeados. Representam o mapeamento da integração de fenômenos, feições, fatos ou acontecimentos que se interligam na distribuição espacial. Esses mapas permitem que se estabeleçam estudos conclusivos sobre a integração e interligação dos fenômenos. Entre os exemplos de mapas de síntese encontram-se os mapas de uso do solo (figura 14), mapas de sensibilidade e mapas de zoneamento, mapas geomorfológicos e mapas tipológicos diversos.  Os mapas de síntese são construídos para mostrar ao leitor as relações existentes entre vários dados, tal como sua eventual aptidão para determinar conjuntamente outros fenômenos ou outras combinações. Os mapas de síntese devem ser objetivos e legíveis e comportar apenas dados essenciais.
Figura 14 - Mapa de síntese – mapa coroplético representando a síntese de estudos sobre diferentes fenômenos
49Após a conceituação e diferenciação dos diferentes tipos de mapas, podemos considerar que um mesmo mapa também pode ser classificado quanto ao modo de expressão, quanto a escala e conteúdo além do modo de implantação, variável visual e nível de organização.

Considerações finais

50As preocupações de Jacques Bertin com a visualização e comunicação das informações nos mapas continuam sendo objeto de estudo de diversos pesquisadores, que acrescentaram as ferramentas computacionais às pesquisas. Procuram-se as melhores formas de comunicar a informação cartográfica como também, explicitar quais são as respostas que a mente humana dá à apresentação de mapas na tela de vídeo.
51Desde que se conheça a linguagem dos mapas e a gramática cartográfica, existem ferramentas computacionais que ajudam na construção de mapas. Softwares livres disponíveis na internet como o Philcartho (WANIEZ, 2007) e o Spring (INPE, 2007) podem ajudar a reunir e compilar dados espaciais na forma de mapas. No entanto, a observação do conjunto de informações recomendadas neste artigo é fundamental para que se estabeleça uma comunicação efetiva com o usuário, leitor e consumidor de mapas mesmo quando os mapas são elaborados por pesquisadores não cartógrafos, pois o computador não faz tudo, ele é somente uma ferramenta na mão do construtor de mapas.
52Os mapas elaborados para comunicação, construídos para uso público, são julgados por sua aparência e utilidade. Por isso, buscar conceitos e conhecimentos cartográficos para sua elaboração é imprescindível, especialmente, quando se deseja revelar algo por meio da visualização.
53Conhecendo as regras cartográficas, é mais fácil superar os limites técnicos de produção, impostos pelo software escolhido. Isto é, a definição da escala, linhas, pontos, cores e textos, que só serão superados na medida em que o “construtor” de mapas domine o software. Geralmente, para resultados que envolvem mapas impressos, é necessário ainda, utilizar mais de um software e incluir os de designer gráfico, fato que reforça a necessidade de melhor preparo do profissional pesquisador para a elaboração de mapas úteis.

Bibliografia

54ARCHELA, Rosely S. Imagem e representação gráfica. Revista Geografia, Londrina, v.8, n.1, p.5-11, jan./jun. 1999.
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57BRUNET, Roger, La Carte, mode d'emploi, Paris-Montpellier, Fayard-Reclus, 1987
58CONCAR – Comissão Nacional de Cartografia. Cenário Situacional.  Disponível In: http://www.concar.ibge.gov.br/​index156a.html?q=node/​89. Acesso em maio de 2008.
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60JOLY, F. A Cartografia Editora Papirus, São Paulo, 2005 (8ª edição).
61LOCH, Ruth E. Nogueira. Cartografia: representação, comunicação e visualização de dados espaciais. Florianópolis: Ed. Da UFSC, 2006.
63PALSKY, G, Des chiffres et des cartes. Comité des travaux historiques et scientifiques, Paris, 1996.
64SANCHEZ, Miguel Cezar. “Conteúdo e eficácia da Imagem Gráfica”. Boletim de Geografia Teorética, Rio Claro, v. 11, n.21, p. 74-81, 1981.
65WANIEZ, P. Software Philcarto para Windows. Disponível http://philgeo.club.fr/​Index.html. Acesso em maio de 2008.
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Para citar este artigo

Referência electrónica

Rosely Sampaio Archela e Hervé Théry, « Orientação metodológica para construção e leitura de mapas temáticos », Confins [Online], 3 | 2008, posto online em 23 Junho 2008, Consultado o 08 Junho 2013. URL : http://confins.revues.org/3483 ; DOI : 10.4000/confins.3483

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