por: Douglas Belchior
O mês e a semana da consciência negra, celebrada em memória dos líderes Zumbi e Dandara e da revolucionária experiência de Palmares vem sendo cada vez mais incorporada pelos movimentos negros, movimentos sociais e organizações da resistência não só como um momento de reflexão e de festa, mas, sobretudo, como um momento de combate propositivo e enfrentamento às elites racistas deste país.
Com a atual crise do capitalismo, aumentam as injustiças sociais e o povo negro sofre ainda mais. O Estado brasileiro, aliado às elites racistas, impõe a violência e a morte, presentes nas ações policiais nos morros cariocas, nas periferias de São Paulo, Salvador e em todas as demais grandes cidades.
Nos últimos meses a violência do estado policial, comum a nós, ganhou notoriedade em toda imprensa. Os conflitos patrocinados pela polícia militar em regiões periféricas de São Paulo (casos de Heliópolis, Capão e Paraisópolis) provocaram um sentimento de revolta que a cada dia é mais canalizado para a luta por direitos e contra as injustiças. No Rio de Janeiro e na Bahia a população negra sofre como nunca antes nas mãos armadas do estado repressor que ocupa seus espaços, invade, agride, encarcera e mata.
Essa revolta ganha mais sentido à medida que pesquisas como a do estudo da Uerj/Unicef, revelam que as mortes violentas correspondem a 46% dos óbitos de adolescentes no país e é a principal causa de mortes na faixa etária entre 12 e 18 anos. Com isso 33 mil adolescentes deverão morrer por conta da violência até 2012. São quase 5 mil mortes por ano. Em geral, o adolescente assassinado é homem, negro e tem baixa escolaridade.
As desigualdades permanecem em todos os níveis: negras/os recebem em média 53% da renda dos brancos. A taxa de desemprego entre negras/os é de 9,3% enquanto que a de brancas/os é de 7,5%. Nos setores com menor remuneração a maioria das/os trabalhadoras/es é negra, caso da agricultura (60,3%), construção civil (57,9%) e serviços domésticos (59,1%). Cerca de 5% dos negro/as formam-se em cursos superiores ao mesmo tempo em que 18% dos brancos atingem esse mesmo grau de estudo.
Se no período da escravidão a população africana e seus descendentes eram submetidos aos castigos nas máscaras de ferro, tronco, gargalheira, libambo, além de açoites públicos no pelourinho, hoje a tortura está travestida e institucionalizada pelas polícias militares que detém autorização para abordar, prender, torturar e matar. Se nos tempos da colônia e do Império as famílias negras eram fragmentadas ao serem os seus membros vendidos para senhores diferentes, hoje as famílias negras são fragmentadas graças ao caos social vigente, à precarização dos serviços e direitos essenciais e principalmente pela violência e a barbárie que teima em vitimizar especialmente os negras/as.
Mais que constatações, são necessárias ações que provoquem a população negra para um protagonismo que será fundamental na luta de classes brasileira. A organização comunitária através dos cursinhos pré-vestibulares e núcleos de base apresentam-se como uma das alternativas de organização para esse fim.
Desde a República de Palmares, que foi o mais importante testemunho do poder de organização política, econômica e militar dos negros na América Latina, nossa população se fez presente em todos os levantes sociais nos períodos da Colônia e do império. A resistência negra se deu historicamente na prática da luta pela sobrevivência e permanece assim até nossos dias. A nós resta lutar!
Daí a importância em integrar as demandas e pautas dos mais diversos movimentos às lutas do povo negro, assim como será fundamental para o acúmulo de forças e para a construção de um novo projeto de país a integração da questão racial como um elemento estruturante das desigualdades sociais e não apenas como assunto temático ou setorial.
A luta por educação pública, gratuita e de qualidade, por um sistema de saúde eficiente e acessível, por reforma agrária e urbana, por moradia digna, a luta contra os interesses do grande capital especulativo, do sistema financeiro e bancário, do latifúndio e do agronegócio são bandeiras que devem ser apropriadas pelos movimentos negros, afinal, suas conseqüências sociais atingem especialmente a população negra.
a mesma forma esperamos que os/as companheiros/as dos diversos movimentos sociais considerem a necessidade e a urgência do combate ao racismo e às desigualdades dele recorrente, que hoje hegemoniza nossas relações e está institucionalizado e enraizado em toda a sociedade. Só assim teremos chances de vitória no combate à burguesia racista brasileira.
Fomentar a consciência negra é resgatar a consciência de classes e de luta. Portanto, dia 20 de novembro é dia de ação e de enfrentamento!
Douglas Belchior é professor de história e membro do Conselho Geral da Une
Fonte: http://www.geledes.org.br/
Nenhum comentário:
Postar um comentário