Imposição de metas abusivas e cobrança por produtividade contribuem para o surgimento de doenças nos trabalhadores
Por Michelle Amaral
A
organização do trabalho atual, em nome de uma maior produtividade,
exige que os trabalhadores tenham atribuições flexíveis e consigam
trabalhar em várias frentes concomitantes, devendo ter individualmente
um empenho considerado satisfatório. O desempenho de cada um é medido
através do cumprimento de metas impostas pelas empresas, muitas vezes
consideradas abusivas pelo esforço e dedicação que requerem dos
empregados.
Para especialistas, as dificuldades de
se atingir o padrão estabelecido por este tipo de organização laboral
contribuem para o adoecimento físico e mental dos trabalhadores. “As
metas pressionam na direção de um ritmo acelerado de trabalho, colocando
o sujeito sempre no lugar de quem está devendo, de quem pode ser
rebaixado”, explica a psicóloga Renata Paparelli.
Foi
o que aconteceu com Regina* durante os 24 anos em que trabalhou como
caixa em um banco. “Além de dar conta do meu serviço, tinha que cumprir
as metas de vendas de produtos que eram impostas. Mas eu não era boa
vendedora, eu era caixa”, conta a bancária, que afirma ter sofrido
diversos tipos de pressão em relação ao cumprimento das metas. “Para
pressionar, eles colocam sua vaga de emprego em dúvida, fazem reuniões
antes do expediente com a desculpa de dar dicas, quando, na verdade, só
querem fazer pressão sobre você”, relata.
Reorganização
Para
Plínio Pavão, diretor da Confederação Nacional dos Trabalhadores do
Ramo Financeiro da CUT (Contraf-CUT), o problema da organização do
trabalho é que ela não é feita a partir da percepção do trabalhador
sobre a atividade a ser realizada. “Não se pode pensar a execução do
trabalho sem levar em conta a opinião de quem vai executá-lo”, defende o
sindicalista, para o qual, “os métodos de pressão por cumprimento de
metas são absolutamente cruéis e influenciam diretamente a vida pessoal
dos trabalhadores”. Além disso, o pesquisador do Centro de Tecnologia e
Informação Renato Archer (CTI-MCTI), Marco Antônio Silveira, alerta para
o fato de que o estado mental e emocional dos trabalhadores impacta
diretamente em sua capacidade de aprendizagem e de trabalho em equipe.
“Portanto, afeta diretamente a sua capacidade de implantar melhorias e
inovações, condições fundamentais para a inserção competitiva das
empresas nos dinâmicos mercados atuais”, analisa.
Invisibilidade
A
concessão de auxílios-doença por causa de transtornos mentais e
comportamentais em 2011 foi 20% maior do que em 2010, conforme dados da
Previdência Social. No entanto, segundo especialistas, as notificações
deste tipo de adoecimento ainda estão aquém do número real de casos. “é
bastante difícil estabelecer a relação entre o transtorno mental
(efeito) e as condições de trabalho (causa)”, analisa Silveira. O
pesquisador do CTIMCTI afirma também que o adoecimento mental de
trabalhadores ainda é um assunto tabu dentro das empresas, cercado de
preconceitos, medos e desconhecimento. “Ao perguntar se na empresa há
problemas de transtornos mentais, a resposta padrão é não. No
desenvolvimento da conversa, contudo, fica claro que o problema
obviamente existe”, relata.
Dessa forma, grande
parte dos casos de adoecimento mental não são tidos como acidente de
trabalho e a maioria dos empregados acaba se afastando sem essa
caracterização. Consequentemente, estes trabalhadores são privados do
benefício previdenciário devido.
Mesmo nos casos em que
há a notificação ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).
Pavão relata que os trabalhadores têm o tratamento médico adequado
negligenciado. No momento do afastamento, os pacientes já recebem um
prognóstico do tratamento, com o tempo para o retorno ao trabalho
estabelecido. No entanto, Pavão salienta que quando se trata de problema
mental não dá para se fazer um prognóstico. “É uma situação dramática
para o trabalhador, que adoece por causa da atividade profissional, tem
uma grande dificuldade de caracterizar o caso como doença do trabalho,
recebe um benefício de 120 dias no máximo e sabe que depois desse
período vai ter que voltar nas mesmas condições”, pondera.
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