Em agosto de 2012 a
Voyager 1 foi para onde nenhum objeto feito por seres humanos foi antes:
cruzou a “heliopausa”, a borda mais externa da heliosfera do Sol, e
entrou no espaço interestelar.
Antes
que a Voyager 1 deixasse a bolha do território dominado pelo Sol, ela
coletou nossos primeiros dados sobre as fronteiras frias e escuras que
marcam o limite interestelar. Agora, a Voyager 2 está fazendo a mesma
viagem – passando pela camada externa de nossa heliosfera, em direção a
tudo o que está além dela. Mas cinco anos depois, essa viagem está se
tornando algo notavelmente diferente.
“O limite onde a Voyager 2 está saindo da heliosfera é bem diferente
do que o da Voyager 1”, explica Ed Stone, ex-diretor do Laboratório de
Propulsão a Jato da NASA. “O que torna as comparações e extrapolações
bastante incertas”.
Descobertas diferentes
Stone está fazendo essas comparações de qualquer maneira. Tendo
trabalhado na primeira missão desde 1972, ele sabe melhor do que a
maioria quão preciosos e únicos são os dados coletados. Como ele
explicou durante uma palestra na American Geophysical Union Conference,
as diferenças entre o que as duas sondas estão vendo quando passam pelos
confins da heliosfera oferecem um vislumbre sem precedentes na
estrutura dessa bolha de estrelas que chamamos de lar.
No centro desta bolha está o Sol, que emite fluxos de partículas de
alta energia, chamados de vento solar. À medida que se dissemina no
vácuo do espaço, o vento solar forma algo um pouco como uma atmosfera
planetária, só que muito maior. Isso é chamado de heliosfera.
Como a atmosfera da Terra, as coisas dentro da heliosfera são
separadas das coisas fora – neste caso, um vento interestelar composto
de partículas diferentes deixadas por estrelas mortas – por um campo
magnético. A grosso modo, o campo magnético do Sol borbulha em uma
região do espaço 100 unidades astronômicas (UA) de largura (1 unidade
astronômica é a distância entre a Terra e o Sol).
Mas a bolha não é hermética. O espaço interestelar e a heliosfera
interagem, principalmente, em uma região vasta e mal estudada chamada
“heliosheath”. É esta região do espaço que a Voyager 2 está agora
atravessando. Como Stone explicou em sua palestra, os dados recentes da
sonda espacial oferecem novas ideias sobre o que está acontecendo lá.
Ambientes diferentes
Quando a Voyager 1, que é dirigida para o norte do equador solar,
atravessou a heliosheath entre 2004 e 2012, testemunhou um aumento
constante de partículas de alta energia, chamadas raios cósmicos
galácticos (GCRs, na sigla em inglês). Mas a segunda sonda, que agora
está passando pela heliosheath pelo sul, não está vendo este aumento.
“Com a Voyager 1 essa intensidade [de GCRs] dobrou quando passamos pelo
último trecho”, disse Stone. “Com a Voyager 2, a intensidade é muito
plana no tempo”.
Stone
suspeita que a discrepância tem a ver com o fato de que estamos agora
em uma fase mais ativa no ciclo solar. Os GCRs são intrusos
interestelares. Eles atravessam nossas fronteiras em maior número quando
o vento solar é fraco. Esse foi provavelmente o caso quando a Voyager 1
estava fazendo esta viagem.
“Quando a Voyager 1 estava na heliosheath, havia atividade solar
relativamente baixa”, explicou Stone. “A Voyager 2 está na heliosheath
quando muito está acontecendo – há um monte de coisas que vêm do Sol.”
Como resultado, estamos agora aprendendo quão forte nossa bolha pode ser
enquanto uma barreira.
Dados da Voyager 2 mostram que dentro da heliosheath, o vento solar
está ficando retorcido e desviado, formando uma cauda longa, semelhante a
um cometa.
Isso é algo que os cientistas esperavam ver, com base em nossa
compreensão teórica do que acontece quando o vento solar incide no vento
interestelar. Mas a primeira sonda não registrou mudanças na direção do
vento. “A Voyager 1 estava em uma zona de estagnação”, disse Stone. “O
vento diminuiu, mas não girou. Mas a Voyager 2 está em um lugar
diferente, e também um tempo diferente”.
A viagem continua
A Voyager 1, a uma distância de 137 UA, dirige-se para a constelação
de Ophiuchus no norte, enquanto a Voyager 2, 113 UA para fora da estrela
doméstica, está a caminho da constelação de Pavo, no sul. Suspeita-se
que a Voyager 2 entrará no espaço interestelar dentro de um ano ou dois,
mas ninguém tem certeza.
“Temos uma expectativa de quando ela atravessará a heliopausa, mas
ela é baseada na Voyager 1, e sabemos que onde a Voyager 2 está é
diferente”, disse o pesquisador.
Mas Stone não se importa de esperar. “Estamos aprendendo como as
estrelas interagem com o que está lá fora”, disse ele. “Tínhamos ideias e
modelos, agora temos dados”.
Mas por quanto tempo as sondas manterão contato com nosso pálido
ponto azul? Ambas as naves espaciais são alimentadas pelo decaimento
radioativo do plutônio-238, que tem uma meia-vida de 88 anos. A
realidade brutal é que todos os anos, as naves espaciais têm menos poder
para trabalhar do que no ano anterior. “Nós já desligamos um monte de
coisas, e vamos ter que continuar desligando conforme o tempo passar”,
diz Stone.
Mas, se tudo correr bem, teremos mais algumas décadas antes delas
desaparecerem no vazio. Até esse dia, as missões Voyager continuarão
ensinando-nos sobre a nossa bolha cósmica, e sobre a imensidão que está
além. Por agora, a viagem continua.
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