quarta-feira, 18 de agosto de 2010

SARESP e IDESP

É impossível permanecer calado frente à aplicação de um projeto neoliberal na educação pública no Estado de São Paulo e da proposta de transformar qualquer sentido humanista da educação em mero valor econômico. A aplicação do SARESP e a produção do IDESP traduzem para o Estado de São Paulo o ponto número 7 da Declaração Mundial de Educação para Todos, aprovada na Conferência de 1990 na Tailândia, patrocinada e coordenada por organismos multilaterais como o BIRD (Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento), BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional).
É obrigação dos defensores da escola pública denunciar que a OMC (Organização Mundial do Comércio) inclui a educação no setor de serviços, o que está se definindo nas reuniões do GATS (Acordo Geral sobre Serviços). Isso significa que o acesso à educação não será mais tratado como um direito social, e sim como um serviço a ser comprado e negociado. E enquanto serviço tem que ser oferecido ao mercado com qualidade e deve ser produtivo e competitivo. Na minuta do acordo da ALCA (Acordo de Livre Comércio entre as Américas) de 2002, no capítulo de serviços, não existe limite para o número de empresas privadas estrangeiras na educação de um país, sem barreiras para o comércio. Segundo este acordo, os governos poderão ser obrigados a reconhecer diplomas ou certificados de empresas do ensino multinacional de cursos on – line. Neste contexto, não é difícil combinar estes dados com os motivos da política de meritocracia, bonificação e avaliação externa de desempenho.
O presente documento está em congruência com todos aqueles que lutam em defesa do ensino público, gratuito e de qualidade. O que importa é a identidade humana, e não a linha de produção; importam as características individuais, e não a massificação; importa a formação, e não o consumo; importam os múltiplos conhecimentos e aprendizados, e não a padronização; importa a construção, e não a competição; importa a formação acadêmica e científica, e não a vulgarização do preparar para empregar, simplesmente atendendo às necessidades do empresariado paulista, cada vez mais sedento de novos ocupantes de vagas cada vez mais exploradas e em condições cada vez mais precarizadas.
Em detrimento dessa opção educacional, resolvemos nos manifestar formalmente diante dos ataques dirigidos ao magistério, provenientes dos administradores da máquina do Estado. Em defesa da proposta de trabalho pedagógico apresentado acima, declaramos que nossos objetivos imediatos são:
1. Não participar institucionalmente de nenhum projeto pedagógico que esteja vinculado e submetido às metas e índices de avaliações externas que visem culpabilizar unicamente o magistério pelo fracasso educacional, ao passo que se esconde dessa maneira o descaso e o abandono para com a escola pública. Assim, atrelam – se essas mesmas metas às necessidades do capital, configurando uma pequena parte de um grande projeto do qual fazem parte instituições poderosas como o BID, a UNESCO e o UNICEF. Entendemos que no bojo deste projeto está uma redução cada vez maior da participação do Estado na educação, o que se dá também através de parcerias com empresas e ONG´s (Organizações Não Governamentais).

2. Continuar com o trabalho pedagógico que já desenvolvemos, inclusive com projetos de nossa autoria e que nunca – ou quase nunca – são valorizados, assistidos ou sequer reconhecidos como existentes pela maioria dos supervisores e dirigentes de ensino. Na maioria das vezes, os mesmos docentes que elaboram estes projetos, também os viabilizam financeiramente por conta própria, arrancando corajosamente subsídios materiais do seu próprio salário extremamente achatado.
3. Priorizar temáticas que envolvam questões de caráter social, e não mercadológico. Antes de aprender uma profissão na escola, o indivíduo necessita reconhecer – se como um ser humano que vive em uma sociedade. Somente após esta conscientização, ele poderá ser um profissional qualificado para a vida social. Empurrar pura e simplesmente uma ocupação no mercado de trabalho não garante realização pessoal e respeito aos colegas do ambiente em que trabalha. Além disso, ditar aos adolescentes que a sua formação deve acima de tudo conduzi – los a uma vaga no mercado de trabalho, não coincide com a verdade, uma vez que a maioria dos jovens que concluem o Ensino Médio permanecem desempregados ou precarizados. Não queremos formar “fazedores de provas”, mesmo porque “devemos mostrar a estes alunos a riqueza do acúmulo cultural, sem fins imediatos, nem tampouco diletantes, unir teoria e prática numa relação dialética com a própria vida. Estudar para quê, já que a conclusão do ensino médio ou universitário não garante sequer o ingresso no mercado de trabalho? Eis a questão. Um trabalho cujos frutos amadurecerão depois de muitos outonos.”
4. Destacar, dentre estas temáticas sociais, aquelas que mais explodem no cotidiano de nossa sociedade e culminam, direta ou indiretamente, dentro da sala de aula. Vivemos em um país com maioria de afrodescendentes que ainda sofre uma verdadeira barbárie racial, fato este que pode ser medido, mais de um século após a Lei Áurea, através da quantidade de afrodescendentes que freqüentam a universidade, versus quantidade de afrodescendentes cumprindo pena em presídios. Aplicar imediatamente a Lei Federal nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003 – que prevê a inclusão do Dia da Consciência Negra no calendário escolar - e executar o parecer das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico – Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro – Brasileira e Africana
5. Construir projetos pedagógicos que trabalhem e debatam a questão de gênero e também de diversidade sexual, em formatos que façam sentido na vida cotidiana de nossos alunos. Visar um convívio social em que o respeito às diferenças existentes entre os indivíduos humanos seja a peça fundamental no combate à intolerância e à violência.
6. Combater as medidas que envolvam destruir o trabalho docente e que colaboram para satisfazer as necessidades capitalistas, transformando nossos alunos em futuros empregados obedientes, que aceitem trabalhar cada vez mais por cada vez menos, sendo ameaçados a todo o momento com o fantasma da demissão. A criação da massa de desempregados na verdade funciona como um índice controlado pelos empresários para deter mais eficientemente qualquer ideia de rebeldia por parte dos trabalhadores.
7. Executar projetos que objetivem construir o aprendizado do aluno através de atividades que estimulem o prazer de estudar e também a identificação do aluno com a escola. Isso pode ser viabilizado através de gincanas culturais, composição de grupos/equipes de trabalho entre os alunos, realizando jogos que estimulem brincadeiras; tendo como objeto principal os conteúdos trabalhados em sala de aula.
8. Exigir que todos os projetos com fundamentação teórica/científica/pedagógica elaborados e executados pelos docentes nas escolas recebam a mesma verba oferecida para os projetos de “aumento do IDESP”. Verba da educação pública tem que ser destinada para projetos que garantam a continuidade do trabalho pedagógico desempenhado pelo docente, e não para avaliações institucionais externas que não refletem a realidade, o cotidiano e as dificuldades escolares.
* Manifesto apresentado pelos professsores da EE Jorge Rahme e aprovado na executiva regional de 07/08.
Fonte: http://apeoesp.blogspot.com/

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