Por raquelrolnik  
Dados do censo do IBGE de 2010 recentemente divulgados revelam  que, pela primeira vez, o número de pessoas que se declaram negras e  pardas é maior do que o das pessoas que se declaram brancas. Entre os  mais de 191 milhões de brasileiros, 91 milhões se declaram brancos  (47,7%), 15 milhões pretos (7,6%), 82 milhões pardos (43,1%), 2 milhões  amarelos (1,1%) e 817 mil indígenas (0,4%). Somando negros e pardos, são  97 milhões.
Uma das hipóteses que explica o crescimento da população que se  afirma como negra e parda é a maior taxa de fecundidade entre as  mulheres desses grupos, comparativamente com as mulheres brancas, embora  venha caindo sem parar o número de filhos por mulher no Brasil, em  todos os grupos e regiões. Outra explicação, mais subjetiva, tem a ver  com um processo de mudança na percepção da própria cor – consequência de  todo o trabalho de valorização da cultura negra realizado há décadas  pelo movimento negro, das políticas afirmativas e de reparação  empreendidas nos últimos anos pelos governos, de um debate mais aberto  nos meios de comunicação sobre a questão, etc. O fato é que hoje podemos  dizer – de boca cheia – que o Brasil é um país negro e mulato.
Isto quer dizer que vivemos em um paraíso racial, cultura milagrosa  de convivência harmônica e mistura de todas as origens étnicas? De forma  alguma… as desigualdades entre pretos, pardos e brancos reveladas pelo  censo são gritantes. A população negra, em geral, continua a receber  menores salários que a população branca. Entre as mulheres negras, a  situação é ainda pior. De acordo com os dados do IBGE, entre a população  com rendimento mais alto (os que ganham mais de 30 salários mínimos por  mês), existem 178.574 homens brancos e apenas 838 mulheres negras. Por  outro lado, entre a população com menor rendimento (os que ganham até  1/4 do salário mínimo), existem 418.013 homens brancos e 2.501.852  mulheres negras e pardas. Veja os dados percentuais na tabela abaixo.  Para ver os dados completos na tabela do IBGE, clique aqui.
Do ponto de vista urbanístico, as desigualdades são claras: em São  Paulo, a proporção de negros com relação a brancos em cada bairro  aumenta no sentido centro-periferia (Leia mais aqui).  Em Brasília acontece o mesmo entre o plano piloto e as cidades  satélites. Ou seja: quanto mais precários os bairros, maior a proporção  de pretos e pardos. Nestes lugares é mais precária a oferta de  equipamentos e serviços públicos, menores as oportunidades de empregos, e  isso cria um círculo vicioso que dificulta a ascensão econômica e  social da população dessas regiões.
Ainda com relação à dimensão urbanística dessa questão, por muito  tempo existiu uma espécie de invisibilidade histórica dos territórios  negros das cidades, que só muito recentemente vêm sendo, aos poucos,  reconhecidos e valorizados, com o tombamento de terreiros de candomblé, a  demarcação de áreas de quilombo etc. Em São Paulo, foi criada este mês a  Rota Turística Afro-brasileira Luiz Gama, um roteiro com 18 pontos  turísticos relacionados à cultura africana, incluindo territórios negros  da cidade dos séculos XVIII e XIX. Iniciativas como esta são muito  interessantes para o reconhecimento destes locais e sua (re)incorporação  em nossa história. Mas o caminho para o tal paraíso racial ainda é  longo… e difícil!
Texto originalmente publicado no Yahoo!Colunistas.
Fonte : http://raquelrolnik.wordpress.com
 


 
 
Nenhum comentário:
Postar um comentário