quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Sobre as Diretrizes para Novos Planos de Carreira e de remuneração do Magistério dos Estados, do Distrito Federal, e dos Municípios

Por João Zafalão* e Paula Pascarelli**
Análise Crítica do Parecer 09/09
No dia 02 de abril de 2009, foi aprovado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), o parecer CNE/CEB nº 9/09, que faz uma revisão da Resolução CNE/CEB nº 3/97, que fixa as diretrizes para os Novos Planos de Carreira e de Remuneração para o Magistério dos Estados, do Distrito Federal, e dos Municípios.
O processo leva o nº 23001.000034/2007-74. O fato novo é que a relatora do parecer CNE/CEB nº 9/09 é a professora Maria Izabel de Azevedo Noronha, a Bebel, presidenta da APEOESP, que é o maior sindicato de professores do Brasil e que protagonizou muitas lutas em defesa da educação e da qualidade do ensino. O que todos esperavam era encontrar no PARECER as propostas construídas coletivamente pelo movimento docente, durante anos de luta contra as políticas elitistas e neoliberais aplicadas por sucessivos governos. Infelizmente não é isso que encontramos no PARECER.
Vejamos o que se propõem:
Sobre os Princípios dos Planos de Carreira
Art. 4º. As esferas da administração pública que oferecem alguma etapa da educação básica, em quaisquer de suas modalidades, devem instituir planos de carreira para todos os seus profissionais do magistério, e, eventualmente, aos demais profissionais da educação, conforme disposto no § 2º do art. 2º desta Resolução, dentro dos seguintes princípios:
II - acesso à carreira por concurso público de provas e títulos e orientado para assegurar a qualidade da ação educativa;
III - remuneração condigna para todos e, no caso dos profissionais do magistério, com vencimento ou salários iniciais nunca inferiores aos valores correspondentes ao Piso Salarial Profissional Nacional, nos termos da Lei nº 11.738, de 2008;
V - progressão salarial na carreira, por incentivos que contemplem titulação, experiência, desempenho, atualização e aperfeiçoamento profissional;
VII - jornada de trabalho preferencialmente em tempo integral de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais, tendo sempre presente a ampliação paulatina da parte da jornada destinada às atividades de preparação de aulas, avaliação da produção dos alunos, reuniões escolares, contatos com a comunidade e formação continuada, assegurando-se, no mínimo, os percentuais da jornada que já vêm sendo destinados para estas finalidades pelos diferentes sistemas de ensino, de acordo com os respectivos projetos político-pedagógicos;
VIII - promover, na organização da rede escolar, adequada relação numérica professor educando nas etapas da Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, bem como número adequado de alunos em sala de aula nos demais anos do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, prevendo limites menores do que os atualmente praticados nacionalmente de alunos por sala de aula e por professores, a fim de melhor prover os investimentos públicos, elevar a qualidade da educação e atender às condições de trabalho dos educadores;
IX - incentivo à integração dos sistemas de ensino às políticas nacionais e estaduais de formação para os profissionais da educação, nas modalidades presencial e a distância, com o objetivo de melhorar a qualificação e de suprir as carências de habilitação profissional na educação;
XII – estabelecimento de critérios objetivos para a movimentação dos profissionais entre unidades escolares tendo como base os interesses da aprendizagem dos educandos;
No inciso II determina que o acesso a carreira deva ser feito por concurso público que, aliás, já está na constituição desde 1988 e não é cumprido pelos governantes. O problema está em realizar o concurso sem garantir uma transição para os professores “temporários”, que segundo o próprio PARECER são 53,5% na rede estadual de Minas Gerais, 48,8% no estado de Mato Grosso e 47% no estado de São Paulo. Sequer determina que os concursos devam ser classificatórios, respeitando a dedicação desses profissionais.
O que o movimento docente exige é estabilidade a todos os professores contratados, como feito com os professores na promulgação da constituição e concurso público classificatório para as novas vagas. A redação permite a demissão destes professores, muitos a mais de 20 anos no magistério, caso não sejam aprovados no concurso. Tem aparência de ser uma medida progressiva, mas não é, pois desrespeita milhares de professores em todo o país.
No Inciso III, determina que os Estados, Distrito Federal e Municípios cumpram a Lei do Piso Nacional da Educação, que é positivo, pois nem isso querem fazer. Porém o movimento docente defende um Piso Nacional por jornada de 20h, referenciado no Piso Necessário calculado pelo DIEESE, que hoje significa R$ 2005,00 por 20h de trabalho e não os R$ 950,00 por 40H
No Inciso V vemos expresso um dos conceitos mais nefastos à educação e a escola pública que é a Progressão Salarial que pode ter, entre outras regras, o desempenho como base, que é utilizado para desqualificar e demitir os professores e não para melhorar a qualidade da educação.
No Inciso VII o Parecer debate a jornada docente. Mais uma vez é cheio de generalidades, porém é conclusivo ao afirmar a necessidade de não reduzir a hora-atividade existente nos estados. Isso significa que sequer está orientando os governos a aplicar a jornada com 1/3 de hora-atividade aprovada na Lei do Piso Salarial Nacional da Educação e muito menos nossa reivindicação histórica de 50% de hora-atividade. Deixa esse tema para as disposições transitórias, fazendo referência a decisão do STF. Hora, não podemos submeter uma concepção educacional, a uma decisão judicial, aguardando que os tribunais decidam qual a jornada adequada.No Inciso VIII apresenta genericamente a relação numérica entre professor-aluno nos vários níveis de ensino, propõe apenas o limite menor ao que é praticado atualmente, não defendendo a proposta histórica de admitir o máximo de 15 alunos por sala de aula no ensino fundamental no ciclo I, 20 alunos por sala de aula no ensino fundamental no ciclo II e 25 alunos por sala de aula no ensino médio.
No Inciso IX está a defesa da qualificação profissional, incluindo o ensino à distância. Essa modalidade é um retrocesso à educação pública brasileira e se não funciona para os alunos por que funcionará como qualificação para os professores? É necessário destacar também que isto possibilita as parcerias com instituições privadas muitas de qualidade duvidosa, abandonando a defesa de formação de qualidade nas universidades públicas e autorizando (aceitando) o desvio de verbas públicas para instituições privadas.
No Inciso XII, estabelece que a remoção dos profissionais em educação não respeitará a opção do professor, mas sim o interesse do educando, que todos sabemos, significará mais arbitrariedade das Secretarias de Educação, vide o decreto 53.037 em São Paulo.
Sobre o Concurso Público e Ingresso no Magistério Art. 5º Na adequação de seus planos de carreira aos dispositivos da Lei nº 11.738, de 2008 e da Lei nº 11.494, de 2007, a União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios devem observar as seguintes diretrizes:
III - determinar a realização de concurso público de provas e títulos para provimento qualificado de todos os cargos ou empregos públicos ocupados pelos profissionais do magistério, na rede de ensino público, sempre que a vacância no quadro permanente alcançar percentual que possa provocar a descaracterização do projeto político pedagógico da rede de ensino, nos termos do parecer CEB/CNE de 2009, assegurando-se o que determina o artigo 85 da Lei 9394/96, que diz que qualquer cidadão habilitado com a titulação própria poderá exigir a abertura de concurso público de provas e títulos para cargo de docente de instituição pública de ensino que estiver sendo ocupado por professor não concursado, por mais de seis anos;
No Inciso III, se determina a realização de concurso público, sempre que houver vacância, ou quando houver contratados por mais de 6 anos. Ocorre que essa posição desrespeita milhares de profissionais que estão no magistério, alguns a mais de 20 anos. Em São Paulo são mais de 80 mil professores. O Concurso é uma reivindicação do magistério, mas é necessário estabelecer uma regra de transição, que permita estabilidade aos profissionais que estão nas redes de ensino e estabelecer qual percentual de vagas para realizar estes concursos públicos. Apesar da indicação de 10%, não passa de uma proposta vazia de conteúdo.
Sobre os Vencimentos dos Professores por Titulação
V - diferenciar os vencimentos ou salário iniciais da carreira dos profissionais da educação escolar básica por titulação, entre os habilitados em nível médio e os habilitados em nível superior e pós-graduação lato-sensu, e percentual compatível entre estes últimos e os detentores de cursos de mestrado e doutorado;
No Inciso V existe uma orientação sobre a necessidade de garantir salário maior aos professores de nível superior em relação ao nível básico e de mestrado/doutorado em relação ao nível superior. É justo reconhecer profissionais com maior formação, porém não se estabelece nenhuma regra. Nesse sentido, não serve aos professores uma orientação vazia, pois o “percentual compatível” será decidido pelos estados e municípios, que não querem sequer implementar o Piso Nacional de R$ 950,00.
Sobre a Progressão por Qualificação
XVI – constituir incentivos de progressão por qualificação do trabalho profissional, a partir dos seguintes referenciais, podendo ser agregados outros:
a) dedicação exclusiva ao cargo ou função no sistema de ensino, desde que haja incentivo para tal;
b) elevação da titulação e da habilitação profissional;
c) avaliação de desempenho, do profissional do magistério e do sistema de ensino, que leve em conta, entre outros fatores, a objetividade, que é a escolha de requisitos que possibilitem a análise de indicadores qualitativos e quantitativos; e a transparência, que assegura que o resultado da avaliação possa ser analisado pelo avaliado e pelos avaliadores, com vistas à superação das dificuldades detectadas para o desempenho profissional ou do sistema, a ser realizada com base nos seguintes princípios:
1- para o profissional do magistério:
1.1- Participação Democrática - o processo de avaliação teórica e prática deve ser elaborado coletivamente pelo órgão executivo e os profissionais do magistério de cada sistema de ensino.
2- para os sistemas de ensino:
2.1 – Amplitude - a avaliação deve incidir sobre todas as áreas de atuação do sistema de ensino, que compreendem:
2.1.1- a formulação das políticas educacionais;
2.1.2- a aplicação das mesmas pelas redes de ensino;
2.1.3- o desempenho dos profissionais do magistério;
2.1.4- a estrutura escolar;
2.1.5- as condições sócio-educativas dos educandos;
2.1.6- outros critérios que os sistemas considerarem pertinentes;
2.1.7- os resultados educacionais da escola
No Item C se estabelece a Avaliação Desempenho como um dois indicadores de incentivos de progressão. Esse item é uma afronta aos profissionais de educação, pois é exatamente a política aplicada em São Paulo, para demitir professores em estágio probatório, desqualificar o trabalho docente e isentar o estado de sua responsabilidade. Todos os itens que acompanham essa parte do Parecer, sobre a “participação democrática com elaboração coletiva” é letra morta quando se aplica na prática, pois toda estrutura escolar está sob a lógica da centralização pedagógica e política, com retirada de poderes do Conselho de Escola. Qualquer defesa da Avaliação Desempenho representa legitimar a política de estado e desrespeitar os profissionais em educação.
Sobre o Estágio Probatório
XIX - elaborar e implementar processo avaliativo do estágio probatório dos profissionais do magistério, com participação desses profissionais;
O único sentido para a instituição do Estágio Probatório é a demissão do profissional ao final do período estabelecido. Não é admissível isso, diante do caos educacional que vivemos hoje. Ter compromisso com a educação significa ser contra o estágio probatório.
Conclusão
Muitos que defendem o Parecer 09/09 e seu Projeto de Resolução, argumentam que é um avanço diante da Resolução 03/97, publicada durante o governo FHC.
Diante de toda uma legislação que deve ser seguida e diante de ações judiciais contra pequenos avanços, como a jornada de 1/3 de hora-atividade, se argumenta que o que está na proposta de resolução é que é possível.
O Movimento de Educação sempre defendeu o que é necessário para a garantia da Escola Pública, Gratuita e de Qualidade para todos e em todos os níveis e lutamos por isso. Não concordamos quando um dirigente sindical apóie medidas que não garantem melhoria para a educação e para os profissionais. No caso do Parecer 09/09 representa semear ilusões de que existem elementos progressivos.
O movimento docente exige o máximo de 25 alunos por sala, o fim da promoção automática, o piso do DIEESE por jornada de 20h/a, 1/3 de hora-atividade já, rumo aos 50% de hora-atividade, fim da meritocracia e da política de bonificações. Exigimos a incorporação das gratificações e bonificações aos salários e extensão aos aposentados.
A estabilidade dos professores temporários e concurso público classificatório para os novos. E somos contra qualquer tipo de avaliação de desempenho para os trabalhadores. Estas reivindicações foram construídas em anos de luta do movimento docente.
Essa pauta foi aprovada em congressos da APEOESP, reafirmada em assembléias e em várias greves e são estas reivindicações que deveriam estar contidas no Parecer 09/09 e não a reprodução de políticas excludentes que já são adotadas pelos governos federal, estaduais e municipais que há anos atingem os professores e a escola pública.
Neste sentido, como representante da categoria a professora Maria Isabel deveria defender as deliberações dos docentes em qualquer instância que participe. No caso, fica a pergunta: qual projeto educacional a dirigente sindical defende no Conselho Nacional da Educação? Os dos trabalhadores em educação ou dos governos e patrões?
Parafraseando a juventude francesa de 1968, encerramos afirmando que se é impossível uma escola pública, gratuita e de qualidade para todos, em todos os níveis, democrática, com efetiva participação das comunidades, com profissionais bem remunerados e com sua liberdade de cátedra, sejamos realistas, continuemos a lutar pelo impossível.
* João Zafalão é Secretário de Política Sindical da APEOESP Oposição Alternativa/CONLUTAS
**Paula Pascarelli é Diretora da APEOESP Oposição Alternativa/CONLUTAS

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